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domingo, 15 de outubro de 2017

Série de reportagens sobre uso de verba pública na Confederação de Basquete é premiada

O jornalista LÚCIO DE CASTRO, do site de jornalismo investigativo "agenciasportlight",
conquista Prêmio da Petrobras. 

Tudo começou com um pedido feito junto à Eletrobrás em 2015 com base na  Lei de Acesso à Informação (LAI) solicitando "as prestações de contas e relatórios da Confederação Brasileira de Basquete (CBB) enviados para a Eletrobrás dos anos de 2009 até 2013”.

No site "Agência Sportlight"
Lúcio conta:
"A montanha de documentos era assustadora. Intimidadora. Desanimadora. Mas era preciso encarar. Garimpar é preciso. O suor é sempre maior do que a inspiração, ao contrário do que se imagina quando se vê tudo pronto ali.
Foram meses de várias idas ao prédio da Eletrobras, no Centro do Rio. Tardes inteiras. Um dia lindo lá fora…
Na verdade, foi tanto tempo garimpando que era para ser publicada em um lugar e no meio do caminho tinha mudado…
Muitas vezes se pensa em desistir ao se destrinchar uma montanha dessas de papeis. Mas há um juramento no meio disso tudo, há a certeza de que esse ofício só existe e só pode existir enquanto fiscalizador de qualquer poder.
Tal certeza gerou uma série de oito reportagens: “A Farra do Basquete”, publicadas entre 2015/16 no UOL. (Muito virá pela frente na Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo e isso nos alegra profundamente!)

Eram só papeis, uma montanha. Mas no meio deles existiam histórias. De malversação de verbas, de dinheiro público virando farra em Paris, comissões nababescas que não se sustentavam…

Jantar em restaurante na Torre Eiffel, foto agenciasportlight 

Coisas que até quem vem de longe se impressiona. R$ 15 milhões gastos em repasse para duas agências de marketing pelo mesmo contrato, pagos em diferentes momentos. Trinta e dois por cento (32%) gastos em comissões para agências abertas logo depois da assinatura do contrato…Presidente e mulher viajando de classe executiva para Paris e usando o cartão de crédito da confederação para pagar jantares na Torre Eiffel. Todas as despesas apresentadas ali no meio do bolo da prestação de contas pra Eletrobrás. Enquanto pagava vinhos caros em Paris com o dinheiro da Eletrobrás a mulher do presidente discursava nas redes sociais contra corruptos…Teve muito mais…

Falaremos mais delas e lembraremos um pouco alguns detalhes (para que ninguém esqueça. É tanto escândalo, CBV, CBB, COB, CBDA que as pessoas vão perdendo a conta. Mesmo).

Nesse momento, mais do que nunca, é importante relatar o processo disso tudo como está acima.

No exato momento em que muitos ignoram a essência do nosso ofício e acham que só esperando MPF, PF, etc se pode fazer algo, é preciso lembrar: muito se pode fazer. Quase tudo. Fontes públicas. Se isso valer como inspiração para um único estudante de jornalismo, já terá valido a pena.
A questão é vontade. E isso é uma decisão política, embora tantos tenham pavor da palavra. É querer.
Cumprir tais prerrogativas implica em investigar, apurar, fustigar, independente de quem seja o poder.
Viver apenas, novamente e sempre ressaltando, com as nobres exceções de sempre, de vazamentos e presentes no lugar do exercício do ofício, tem levado nosso jornalismo ao papel de irrelevância que ocupa hoje no cenário mundial. Salvo as nobres exceções de sempre.
E não estamos falando aqui da irrelevância do nosso jornalismo nos dias de hoje diante de Estados Unidos, Inglaterra, Espanha…As andanças mundo afora em congressos, palestras, debates mostram que nos tornamos irrelevantes ao nos confrontarmos com o que está se fazendo na Costa Rica, em El Salvador, no México…Somos a terceira, quarta, talvez quinta divisão do jornalismo mundial. Embora com muita pose.
Já vamos longe demais nesse papo que começou só pra dar conta da imensa alegria em ver reafirmado, não só pelo prêmio, que é muito, claro, mas pelo carinho, pelo “vamos em frente” de tantos, todos lidos e registrados. Voltaremos ao tema. Hoje é dia de comemorar.
Deixo aqui, com todo carinho, minhas palavras proferidas no palco do Muncipal ontem ao receber o prêmio. Obrigado a todos",

Lúcio de Castro


Discurso ao receber o Prêmio Petrobras de Jornalismo em 9 de outubro de 2017:
Não poderia ser mais significativo estar aqui hoje recebendo esse prêmio de jornalismo esportivo nesse momento, pelas notícias que todos tem acompanhado.

Mas até por isso creio ser fundamental uma brevíssima reflexão sobre nosso ofício.

A essa altura, imagino que ninguém mais tem qualquer dúvida: Havelanges, Teixeiras, Nuzmans e afins só foram possíveis pelas omissões nossas de cada dia.
Nesse momento, em que as trevas e a sombra do autoritarismo, da censura e do obscurantismo se avizinham e se põe sobre nossas cabeças, não poderia deixar tal reflexão apenas para o jornalismo esportivo.
Também não é possível jogar para baixo do tapete e agir como avestruz sem cumprir tais prerrogativas do jornalismo quando tenebrosas transações entregam a cada dia as riquezas de um país sem que isso tenha sido referendado pelo voto.
Queria também dedicar esse prêmio:
Queria dizer que hoje e sempre, Victorino Chermont, irmão que a vida me deu, está presente. É dele também essa honraria. Jornalista maior. Presente.
E sempre, aos meus. Minha família, aos que estão aqui. Todos.
Em especial a minha mãe, a meu pai. Que ao me ensinarem, em seus exemplos diários, um dos principais fundamentos e sentidos da vida, me ensinaram também que eles são a essência do jornalismo.
Fundamento de vida e de jornalismo que poderia estar resumido na frase de Guimarães Rosa sobre a vida: “O que ela quer da gente é coragem”.
A primeira coisa que farei ao sair daqui será dar um beijo e entregar esse prêmio ao meu pai.
Foi com ele, Marcos de Castro, primeiro autor de uma série de jornalismo investigativo sobre esporte no Brasil em 1963, “Futebol, do sonho à realidade”, em parceria com Dácio de Almeida, que me ensinou algo que sempre repete e oxalá me siga como sempre esteve e está com ele: “O jogo é deles, a luta é nossa”.
Muito obrigado.