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terça-feira, 14 de agosto de 2018

O modus operandi de quadrilhas políticas

Arte MPRJ


O modus operandi da quadrilha que foi desbaratada em Casimiro de Abreu é muito revelador de como se faz política em nossa região. "Da quadrilha" não, melhor dizendo "das quadrilhas", pois foram duas as quadrilhas desbaratadas. A operação “Os bastidores” confirmou, segundo o MPRJ, “a existência de dois esquemas no âmbito da administração pública municipal de Casimiro de Abreu, ambos com o intuito de perpetuar seu grupo político no poder”. O primeiro grupo, chefiado pelo atual prefeito municipal Paulo Dames e o segundo grupo, comandado pelo ex-prefeito Antônio Marcos. Uma das quadrilhas está atualmente no Poder. A outra, pretende retornar em 2020.

No município, assim como em muitos outros na Região dos Lagos, havia um revezamento entre os dois ocupantes do Executivo. Paulo Dames, prefeito de 2001 a 2004, se reelegeu em 2005. Antonio Marcos, prefeito de 2009 a 2012, se reelegeu, em 2013. Paulo, retornou ao Poder na última eleição, em 2017.

Para se perpetuar no Poder, o grupo político que está no comando da Prefeitura faz de tudo, inclusive recorrendo a meios ilícitos, tais como, segundo o MP, o oferecimento de dinheiro, cargos e contratos. O outro grupo, que está fora do Poder, faz o mesmo para retornar.

Com o advento da praga da reeleição no final do primeiro governo do Presidente Fernando Henrique, o que mais temos visto na nossa região são dois grupos se revezando no Poder , em condições muito semelhantes às de Casimiro de Abreu. Daí a importância de se acompanhar atentamente os desdobramentos do processo em curso por lá. Muitas lições se podem tirar de tudo isso.

Se realmente existe uma quadrilha instalada no Executivo, como supõe o MPRJ, logicamente se faz necessário também instalar uma ramificação dela no Poder Legislativo, tendo em vista ser este órgão o responsável pelo controle externo do primeiro. Um Poder Legislativo independente e atuante com certeza traria muitos transtornos e dissabores para a quadrilha. Portanto, se o prefeito não fizer maioria na Câmara nas eleições, urge conquistar vereadores das hostes adversárias para obtê-la, de preferência com um vereador a mais que o número de maioria qualificada- quorum necessário para se evitar até mesmo a instalação de CPIs. Em uma Câmara com nove vereadores, como é o caso da de Casimiro de Abreu, seria necessário que se tivesse sete vereadores na mão para que o prefeito, líder da quadrilha, pudesse “governar” tranquilo.

Seria importante que o MP acompanhasse atentamente as eleições para presidente de todas as Câmaras Municipais do país. Com certeza, em quase todas elas, o Prefeito coloca suas mãos interferindo no processo. Escolhe um candidato seu, e entra em campo para cooptar votos necessários para elegê-lo, interferindo desse modo no processo interno de um outro Poder, que supõe-se independente. E sabe-se muito bem como faz isso: oferecendo dinheiro, cargos e contratos. Este foi o caso de Casimiro de Abreu, segundo o MP. Como Paulo Dames elegeu apenas três vereadores precisou cooptar, inicialmente, mais dois vereadores para eleger o seu candidato Rafael Jardim como presidente da câmara para o biênio 2017-2018. Os vereadores Bitó e Marquinho da Vaca Mecânica rapidamente mudaram de lado, e resolveram votar no candidato do prefeito, fazendo com que Dr. Adriano, o candidato mais votado do grupo político adversário, desistisse da ideia de se candidatar.

Em geral, o prefeito eleito faz maioria na Câmara. Mas nem sempre consegue a maioria qualificada de 2/3 do número de vereadores. Já teve casos de prefeito da Região dos Lagos eleger apenas dois dos nove vereadores em sua coligação e, mesmo assim, eleger o presidente da Câmara e, em curto espaço de tempo, inverter a correlação de forças na Casa legislativa, passando a ter sete vereadores em sua base parlamentar contra apenas dois na oposição. Obviamente é de se supor que esses cinco vereadores não mudaram de lado por ideologia ou pelos lindos olhos do prefeito, mas por dinheiro, cargos e contratos.

Um outro momento da Câmara de Vereadores que o MP também deveria acompanhar é a votação das contas de prefeito. Desde que o STF decidiu, ao meu ver erroneamente, mais uma vez em votação por 6 a 5, que é a Câmara de Vereadores, e não o TCE, que tem o condão de tornar o prefeito inelegível, o "passe" de vereador ficou valorizadíssimo. Como o TCE leva mais ou menos dois anos para emitir o parecer prévio das contas, o prefeito terá, pelo menos, duas de suas contas julgadas por uma nova câmara, que geralmente é subjugada pelo novo prefeito com o oferecimento de dinheiro, cargos e contratos. Se o prefeito que sai não tiver feito o seu sucessor, e as contas receberem pareceres desfavoráveis, ele ficará em maus lençóis, correndo o risco de ficar inelegível por oito anos.

Foi o que aconteceu em Casimiro de Abreu em 11 de abril deste ano quando do julgamento das contas do prefeito Antonio Marcos relativas ao último ano de seu mandato- as contas de 2016. Como as contas receberam parecer prévio desfavorável do TCE-RJ, seria necessário maioria qualificada de 6 votos (2/3 de 9 votos) para derrubar o parecer e aprovar as contas.

De acordo com o MP, “o primeiro grupo, chefiado pelo atual prefeito Paulo Dames, envolvendo os vereadores Rafael Jardim (Presidente), Bruno Miranda e empresários locais, objetivando a manutenção de seu grupo político no poder, tentou persuadir a vereança contrária a suas ideias (entre os quais Neném da Barbearia), mediante oferecimento de vantagem ilícita (propina) para que fossem rejeitadas as contas do ex-gestor municipal, Antônio Marcos, tornando-o inelegível para as eleições municipais”.

Só se ficou sabendo do oferecimento da propina e o seu valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) porque o vereador Neném da Barbearia denunciou o fato ao MP no dia 13/07/2018, quando ele entregou áudios com a gravação dos vereadores da situação Rafael Jardim e Bruno Miranda, e também com o empresário Wender Veloso, vulgo Careca do Gás, ofertando esses valores. Pelos áudios depreende-se que o atual prefeito estaria por trás de toda a trama. O empresário Wender Veloso, que detém vários contratos com a prefeitura. WW Casimirense Incorporações, seria o "homem da mala".

Mas o MP apurou que a denúncia feita por Neném da Barbearia não tinha nenhuma motivação republicana. O edil não se preocupou em nenhum momento que as autoridades competentes averiguassem os fatos. Neném, de acordo com o MP, "pretendia reter os áudios com o intuito de obter vantagem, quer prejudicando os interlocutores gravados, quer chantageando-os, para que se alçasse como Presidente da Câmara Municipal". Em depoimento ao MP, em 16/07/2018, o vereador Bruno Miranda disse que, quinze dias após a aprovação das contas do ex-prefeito Antonio (11/04/2018), Neném o chantageou para que votasse nele para presidente da Câmara e cedesse uma assessoria sua para Rodrigo, o autor das gravações. Na verdade, Neném só entregou os áudios porque eles haviam “caídos” no dia anterior (12), quando o MP realizou busca e apreensão na residência do blogueiro Rodrigo Barros, local Neném havia guardado as gravações.

O hábito de gravar os adversários virou costume político na cidade. Parece que ninguém mais confia em ninguém. 
- O blogueiro Rodrigo gravou vídeos com servidores da Câmara de Vereadores de Casimiro de Abreu denunciando que o presidente Alessandro Macabu (20132014; 1/1/2015 a 25/05/2015), vulgo Pezão, ficava com parte de seus salários de cargos comissionados. A partir da divulgação desses vídeos no blog Os Bastidores, um Inquérito Policial foi aberto. Pezão foi afastado do cargo em 25/05/2015 e encontra-se preso.
-O vereador Pezão, contra-ataca gravando alguns vereadores da base do Prefeito Antonio Marcos afirmando que recebiam mesada dele.
-Pezão diz possuir um vídeo da campanha de Antonio Marcos em que uma pessoa teria gravado Mandizão (João Gilberto Alfredique, Chefe de Gabinete do Prefeito Antonio Marcos  2013-2016)   "falando um monte de coisa, falando em dinheiro, de repasse de dinheiro para candidato, crime eleitoral".
- O vereador Odino Miranda, que substituiu Alessandro Pezão na presidência da Câmara em 25/05/2015, por já conhecer o método de atuação e temer o blogueiro Rodrigo, grava as ameaças feitas por este por não tê-lo nomeado para o cargo de Chefe de Gabinete.

O segundo grupo, comandado pelo ex-prefeito Antônio Marcos, incluídos os vereadores Neném da Barbearia e Bitó, segundo o MP, também "com a intenção de perpetuar seu grupo político no poder, incitou vereadores, mediante a utilização de promessas e, inclusive de ameaças, a votarem de modo favorável às contas do governo, a fim de permitir que o grupo prosseguisse com seu intento de voltar a concorrer às eleições de 2020 e comandar o Poder Executivo Municipal no próximo mandato”.

O blogueiro Rodrigo Barros, aquele que faz da “fofoca política seu modo de vida”, de acordo com o MP, ao lado do ex-prefeito Antonio Marcos, “atuou de forma a persuadir os vereadores a votarem favoravelmente ao grupo político a que pertence, incutido pelo desejo de ocupar o cargo de chefe de gabinete da Presidência da Câmara Municipal de Vereadores de Casimiro de Abreu". Para o MP, sua atuação foi muito além pois "interferiu no “jogo” político que circunda o Município, determinando a ocorrência de gravações por parte do vereador Neném da Barbearia, bem como escrevendo discursos para o edil a mando de Antônio Marcos e ameaçando os parlamentares sob pena de divulgar os fatos por ele descobertos através de seu blog intitulado “Os Bastidores”.

Bitó, na qualidade de vereador, membro da Comissão formada na Casa Legislativa para analisar as contas do ex-prefeito e autor do parecer contrário ao do Presidente da Comissão (no sentido de aprovar as contas de Antônio Marcos), segundo o MP,  “na tentativa de perpetuar-se no poder juntamente com seus aliados políticos (grupo do ex-prefeito Antonio Marcos), foi persuadido e induziu outros vereadores a promover a votação das contas do governo de modo a promover os interesses do ex-prefeito Antonio Marcos”.

Finalmente, conclui o MP, RONALDO VELOSO, “atuava na ponta da ORCRIM como verdadeiro “capanga”, coagindo e ameaçando testemunhas, sempre se reportando a RODRIGO BARROSe ANTÔNIO MARCOS

De acordo com o MP, esta segunda quadrilha atua “ao menos no período compreendido entre dezembro de 2009 até os dias atuais, no Município de Casimiro de Abreu, de forma livre e consciente, em comunhão de ações e desígnios criminosos entre si e com outros agentes ainda não identificados, previamente acordados no desenvolvimento de ações minudentemente esquematizadas, em societas delinquentium, agindo plurissubjetivamente, em integração do domínio final dos fatos, em caráter estável e permanente, constituíram e passaram a integrar organização criminosa para o cometimento de vários e sucessivos delitos de ação penal pública, em especial, os crimes de extorsão qualificada, falsificação de documento público, peculato e obstrução à justiça … com o objetivo de obter vantagem financeira ilícita.

Concluindo. A operação “Os Bastidores” deflagrada pelo MPRJ no dia 20 de julho último cumpriu mandados de busca e apreensão nos endereços ligados ao atual prefeito de Casimiro de Abreu Paulo Dames e aos vereadores Rafael Jardim, Bruno Miranda e Neném da Barbearia, Os três vereadores foram afastados do cargo por 180 dias. Também foram expedidos mandados de prisão para o ex-prefeito Antonio Marcos e o blogueiro Rodrigo Barros. O primeiro, que não foi localizado nesse dia, apresentou-se na delegacia cinco dias depois. Está solto desde o dia 3 último graças a um HC obtido no TJ-RJ. O blogueiro permanece preso desde o dia da operação.

Após desdobramentos da operação Os Bastidores, o vereador Bitó, que ocupava a cadeira de presidente, em substituição ao ex-presidente Rafael Jardim, também foi afastado no dia 8 último. Agora são quatro os vereadores afastados. Acredito que os vereadores e o atual prefeito Paulo Dames só não foram presos porque, pelos cargos que detém, possuem foro privilegiado.

Fonte: MPRJ e TJ-RJ